Por: Miguel Peres Santos (Mestre em Gestão Cultural pela Universidade do Algarve) – e-mail: apdsmiguel@gmail.com / Facebook e Instagram: @miguelapdsantos

“Maio maduro Maio, quem te pintou?
Quem te quebrou o encanto, nunca te amou
Raiava o sol já no Sul (…)

Sempre depois da sesta chamando as flores
Era o dia da festa Maio de amores
Era o dia de cantar (…)

Maio com meu amigo quem dera já
Sempre no mês do trigo se cantará
Qu'importa a fúria do mar
Que a voz não te esmoreça vamos lutar (…
)”

José Afonso, Cantigas do Maio (1971)

 

Maio maduro Maio de 1974, os primeiros dias da liberdade, após quatro décadas de uma obscura ditadura levou a que o povo tavirense saísse à rua, onde a euforia tomou conta das pessoas e a alegria de todos, juntou-se à reivindicação de um país melhor, e assim foi logo no primeiro dia do mês.

Apesar do Movimento Democrático Português (MDP) apenas ter convocado uma manifestação pública, para o dia 5 de maio, de forma a celebrar o “25 de Abril”, a população da cidade de Tavira, juntou-se para comemorar de forma espontânea o dia 1 de maio - data comemorativa do Dia do Trabalhador -, assim como “acontecera pelo país”[1] e um pouco “em todo o Algarve[2]. Este dia havia sido instituído feriado nacional pela Junta de Salvação Nacional (JSN), uns dias antes, depois de ter sido proibido de celebrar pelo regime do “Estado Novo” durante mais de 40 anos.

Nesse dia, uma enorme multidão com cartazes e bandeiras nas suas mãos, percorreu as principais ruas da cidade, gritando palavras de ordem, percorreu as principais ruas da cidade acompanhados pela Banda de Tavira.

Fig. 1 – Manifestação realizada em Tavira (Praça da República) no dia 1 de maio de 1974

(Fonte: Jornal “O Tavira”)

Após solicitação à Câmara Municipal Tavira pelos manifestantes e pelo MDP de Tavira, e dado conhecimento ao Comandante do CISMI e ao Governador Civil do Distrito de Faro, foi facilitado o acesso ao edifício dos Paços do Concelho, “a fim de se dirigirem à população reunida na Praça da República (…) por fim o natural desejo de todos comemoraram o dia 25 de Abril e ao mesmo tempo festejarem o dia 1 de Maio e agradecerem a ação das Forças Armadas” [3].

Nesse dia às 18h00, e de uma das janelas do Edifício dos Paços do Concelho tiveram a palavra, alguns reconhecidos e assumidos democratas tavirenses. Começou por usar da palavra Joaquim Teixeira, solicitador em Loulé, seguindo-se os cidadãos tavirenses: José Sequeira, Joaquim Valente, Guilherme Camacho, Eduardo Palma, Dr. Eduardo Mansinho, e Rui Figueiredo, que foram unanimes nas ideias e nas palavras, “centradas na repressão do anterior regime”[4] e nos motivos “que levaram o país a uma crise económica e política”[5].

Depois de ouvidos os discursos e tocado o Hino Nacional por parte da Banda de Tavira, a multidão dirigiu-se para o Quartel Militar do CISMI, como forma de agradecimento aos militares pelo seu contributo na queda do regime do “Estado Novo”, onde o 2º Comandante, o Tenente-Coronel Almeida Pires esperava a população que aí se dirigiu, e agradeceu, tendo tudo corrido dentro na “maior ordem e com o maior espírito de civismo da população”[6].

Alguns dias depois, a 5 de maio, uma nova multidão voltou a juntar-se na Praça da República, desta vez na manifestação de apoio ao MFA e ao programa da Junta de Salvação Nacional, que havia sido organizada e convocada pelo MDP de Tavira, alguns dias antes[7], e para a qual fora solicitado à Câmara Municipal de Tavira, o edifício dos Paços do Concelho. Esse pedido seria feito pelo MDP de Tavira, representado por José Joaquim Valente[8].

Antes dos discursos, foi lido um comunicado deste movimento, designado “Comunicados dos Jovens à População de Tavira”, onde foi desmentido as afirmações prestadas pelo Comandante do CISMI à imprensa e se fez algumas apreciações à atuação do executivo municipal “contra os interesses do povo”[9] e foi exigida a “imediata destituição dos referidos elementos”[10]. Este comunicado também “propunha a demissão de algumas entidades administrativas e escolares”[11], entre outras conclusões “a apresentar à Junta de Salvação Nacional”.

De seguida, fizeram-se ouvir algumas individualidades ligadas ao MDP, com destaque para Dias da Costa, que se elevara a mentor de todas as movimentações e que dirigiu à “assembleia” que assistia à manifestação, apresentando uma série de moções para votação, como a “tomada da Casa dos Pescadores, Grémio do Comércio, Casas do Povo, Grémio da Lavoura, etc.“[12] e a “tomada pelos Democráticos Tavirenses, a Câmara Municipal com comunicação, se não estiver presente, ao cidadão Luís Filipe Lobo de Miranda Malheiro Távora, representante local do regime, abatido das suas funções e dos restantes membros da Câmara, se entretanto não se demitirem”[13], todas elas “aprovadas”[14] por quem assistia.

A este orador seguiram-se Manuel Rodrigues Pereira (de Olhão), João Camacho (de Mértola), Manuel Bom (da Fuzeta) e Guilherme Camacho, que seguiram nas suas palavras o que já havia sido dito no comunicado. A manifestação terminou ao som do Hino Nacional, dispersando-se a multidão “em ordem, marcando mais uma vez o civismo das gentes tavirenses”[15].

Em Santa Catarina da Fonte do Bispo, uma das freguesias mais rurais do concelho de Tavira, também fora divulgada no dia 4 de Maio, que haveria uma manifestação no dia seguinte em Tavira, mas a distância entre as duas localidades e o interesse da população em celebrar o “25 de Abril” era muito grande, mas a inviabilidade de deslocação para maioria das pessoas, fez com que a população que se juntasse em grupos.

Segundo a imprensa da época, a população teria sido surpreendida pela manhã do dia 5 de Maio, com a rua principal e o largo da Igreja inundado de panfletos com palavras de ordem relacionadas com o momento politico que atravessava o país[16]. Pelas 14 horas, a população desta aldeia iria concentrar-se no largo da Igreja para ouvir discursar o reconhecido democrata de Santa Catarina da Fonte do Bispo, José Gago Sequeira que divulgou a Comissão Executiva do MDP de Santa Catarina da Fonte do Bispo e o Dr. Carrapato, vindo de Faro, e que se distinguia por ser um reconhecido advogado da região, tendo sido divulgado o seguinte comunicado:

“O Povo democrático de Santa Catarina, que esteve sempre em luta constante contra o fascismo em defessa das suas liberdades fundamentais e pela conquista da Democracia em Portugal, reuniu-se pelas 14 horas do dia 5 de maio, em Plenário, no Largo 25 de Abril e deliberou o seguinte:

1º Que fosse enviado à Junta de Salvação Nacional um telegrama dando todo o apoio do Movimento Democrático de Santa Catarina ao programa estabelecido pela mesma Junta na vida política Portuguesa;

2º Que a Comissão Executiva do Movimento Democrático de Santa Catarina fosse constituída pelos seguintes cidadãos: JOSÉ GAGO SEQUEIRA, MANUEL SALVADOR MADEIRA JÚNIOR, JOÃO DE JESUS ESTÊVÃO, JOÃO DELFIM DO CARMO AGOSTINHO, VENÂNCIO FELIZ GAGO CAVACO, JOSÉ MARIA PIRES GONÇALVES, MARIA ADELINA GAGO SILVÉRIO, MARIA ADÉLIA DE JESUS MIGUEL ESTÊVÃO E MARIA JOÃO GONÇALVES;

 3º Que fosse dado poderes à Comissão Executiva do MDSC para nomear Comissões Administrativas a fim de tomar conta da Junta e da Casa do Povo da Freguesia e organizar imediatamente eleições livres para que o Povo tome conta dos respetivos Organismos;  

4º Que o Largo da Aldeia passe a chamar-se “Largo 25 de Abril” e à rua principal a “Rua 1º de Maio”;

5º Que a Comissão Executiva do MDSC seja representada por um ou mais elementos na Comissão Executiva Concelhia do Movimento Democrático.”[17]

Após os discursos, a população saiu ordeiramente em desfile pelas ruas da aldeia, “dando cumprimento a uma das reivindicações apresentadas”[18] pela Comissão do MDP local: dar à rua principal o nome de Rua 1º de Maio e ao largo da Igreja de Largo 25 de Abril.

A designação da Rua 1º de Maio, só seria oficializada dois anos depois, em reunião da Câmara Municipal de Tavira de 22 de junho de 1976, conforme consta em ata: “Verificando-se que logo após o vinte e cinco de abril de mil novecentos e setenta e quatro o povo mudou a designação da Estrada Nacional que atravessa a Aldeia, para Rua Primeiro de Maio e que a Junta de Freguesia deu parecer favorável, foi deliberado aceitar aquela nova designação, passando a rua a ser denominada Rua Primeiro de Maio e o largo por Largo Primeiro de Maio”[19].

Fig. 2 – Comunicado do MDP de Santa Catarina da Fonte do Bispo de 5 de maio de 1974 (Fonte: Arquivo Municipal de Tavira)

Uma situação semelhante relacionada com a mudança toponímica também se verificou na Cidade de Tavira, onde “um movimento popular, dirigido por Joaquim José Valente, representante da Comissão Executiva do MDP (Movimento Democrático Português)”[20], acompanhado por outros elementos do mesmo movimento procederam ao “arranque e destruição das placas toponímicas da Rua D. Marcelino Franco”[21]. Nesta caso, nunca existiu uma mudança oficial do nome, mantendo-se ainda essa designação nos dias de hoje.

Nos anos do “Estado Novo”, não era fácil a criação de qualquer periódico de imprensa regional, muito devido à questão do controlo da informação que era distribuída, assim como, à censura prévia a que estavam sujeitos estes órgãos de informação. Em Tavira, em 1974, existiam dois periódicos em circulação com redação neste concelho. Eram eles o “Povo Algarvio”, fundado em 1934, sendo durante 40 anos um fiel servidor do regime, sendo veiculo da propaganda do mesmo na região do Algarve, e o Jornal “O Tavira”, propriedade do Ginásio Clube de Tavira e fundado em 1973, sob o comando de Ofir Chagas e Luís Horta.

Estes periódicos, apenas começaram a escrever sobre o “25 de Abril”, no mês de maio de 1974, até aí não consta qualquer informação sobre os acontecimentos, nem a publicação de uma edição especial acerca do mesmo, como acontecera com outras publicações do género.

A primeira referência ao “25 de Abril”, surge no Jornal “O Tavira”, de 2 de maio de 1974, um dia após a primeira grande manifestação realizada em Tavira, sendo que a mesma se resume a um pequeno artigo na primeira página, intitulado “Nacionalidade”, assinado por Ofir Chagas, diretor da publicação. Este pequeno artigo, refere em poucas linhas os acontecimentos, e algumas das linhas orientadores do programa da Junta de Salvação Nacional, liderada pelo General António de Spínola, assim como apresenta os votos do jornal “para que o povo e os novos governantes militem em consciência comum, a fim de permitirem que o programa apresentado arranque da nossa nacionalidade, um País construído por HOMENS.”[22] Seria apenas na edição de 16 de maio de 1974, que este periódico daria mais destaque ao momento histórico que o país atravessava, com uma série de artigos, assinados por diversos colaboradores regulares e com destaque para as mais variadas manifestações democráticas e revolucionárias realizadas no Concelho de Tavira, tendo o diretor Ofir Chagas, chamado para a primeira página mais um artigo por si assinado e intitulado “Somos Isto!”, onde tenta justificar a ausência de notícias acerca do “25 de Abril”, dizendo então: “no nosso último número, já que porque tivemos de antecipar a composição do jornal (por interesse dos serviços gráficos, que há muito comemoram o 1º de Maio), não podemos incluir alguns trabalhos que dariam aos acontecimentos do 25 de Abril o relevo proporcionado por uns e esperado por outros, facto que fica bem expresso agora. Daí a certeza do nosso jornal não “virar a casaca”, pois aquela que já trazia vestida, desde o seu primeiro número, era velha de ambos os lados.”[23]

Por incrível que pareça, foi o jornal “fiel do regime”, o “Povo Algarvio”, que mais destaque deu ao “25 de Abril”, na sua primeira edição publicada a seguir a esta data histórica, a 4 de maio de 1974, um dia antes da manifestação convocada pelo MDP de Tavira e dias depois do 1º de Maio. Uma primeira página totalmente dedicada ao tema, onde constam as transcrições da “Proclamação do Movimento das Forças Armadas” e da “Proclamação da Junta de Salvação Nacional”, ou mesmo títulos efusivos como “No passado dia 25 de Abril: As Forças Armadas Portuguesas tomam conta do poder”, “25 de Abril: Uma data histórica a assinalar” ou “Em Tavira: Patrióticas Manifestações de Apoio às Forças Armadas”, mostram um maior entusiamo com os acontecimentos, do que aqueles que foram publicados no jornal que se afirmava situar-se “nos sãos princípios democráticos que dignificam o homem”[24].

    

Fig. 3 – A imprensa local tavirense a dar a notícia do “25 de Abril” e das manifestações de apoio realizadas ao Movimento das Forças Armadas (MFA) que tiveram lugar na cidade a 1 e 5 de maio de 1974

Após o “25 de Abril”, e seguindo aquilo que ia sendo norma um pouco por todo o país, generalizou-se a organização democrática de diversos movimentos, que tinham como objetivo a reivindicação de medidas de progresso social, político e democrático, assim como movimentos que tinham como objetivo principal o de proceder ao saneamento de algumas entidades corporativas ligadas ao regime deposto. Em Tavira, estas movimentações, iriam ter lugar dentro de diversas associações, instituições públicas ou mesmo de forma espontânea em vários sectores da população, um pouco por todo o concelho.

Depois das palavras proferidas por alguns membros e grupos ligados ao MDP, no sentido de serem saneadas as entidades corporativas ligadas ao regime deposto, verificam-se alguns episódios que foram relatados pela imprensa local, como é caso do saneamento da Casa do Povo da Luz de Tavira, onde Dias da Costa e Joaquim Valente, acompanhado de uma força do exército, foram aguardados pela direção e por uma multidão de pessoas junto da sede desta entidade. Após “muitas hesitações”[25] e alguma tensão entre as partes, a direção ligada ao anterior regime demitiu-se e logo se realizou o ato eleitoral para escolha dos novos órgãos sociais provisórios que ficariam responsáveis pela transição democrática nesta entidade: “(Assembleia Geral: Presidente - José Evangelista Cabeçudo; 1º Vogal – Joaquim António Rosa; 2º Vogal – Joaquim Pedro Flor da Rosa / Direção: Presidente – António Evangelista Tomé; Secretário – Dr. Rui Aboim; Tesoureiro – João da Conceição Fernandes; Vogal – António de Jesus Patarata)”[26].

No seguimento de uma deliberação da Junta de Salvação Nacional, que ordenou a exoneração de todos os Capitães de Porto que acumulavam a sua função com a de Presidentes das Casas dos Pescadores, a 4 de maio de 1974, reuniram-se em Tavira, para uma Assembleia Geral centenas de pescadores oriundos de Vila Real de Santo António, Castro Marim, Cabanas de Tavira, Santa Luzia e Tavira, todos eles abrangidos pela Casa dos Pescadores de Tavira.

Ao contrário da tensão registada no saneamento da Casa do Povo da Luz de Tavira, esta reunião “decorreu na maior harmonia, tendo assistido, a pedido dos pescadores, o Sr. Comandante Pires Dias, comandante dos Portos de Tavira e Vila Real de Santo António”[27], que havia sido exonerado do cargo. Dentro do espírito democrático que reinava nestes dias após o “25 de Abril”, a eleição recaiu sobre um representante de cada centro piscatório, ficando a nova direção constituída pelos seguintes associados: Presidente – José Rodrigues Faleiro (Tavira); Vice-Presidente – João Peres Gomes (Vila Real); Secretário – José da Cruz Calhau (Cabanas) e Tesoureiro – António José Salve Rainha (Santa Luzia)[28].

A 5 de Maio de 1974, os Bombeiros Municipais de Tavira foram um dos primeiros grupos sociais a reunir neste concelho. Esta reunião contou com a presença das corporações de Faro, Loulé, Olhão, Lagos, Monchique, Portimão, São Brás de Alportel, Silves e Vila Real de Santo António. As corporações presentes decidiram demonstrar o seu total apoio ao programa da Junta de Salvação Nacional e deliberaram que fosse solicitado a “reestruturação orgânica dos bombeiros[29] e a dotação de melhor material para o bom desempenho da sua missão”[30].

Alguns dias após esta reunião, a 10 de maio de 1974, realizava-se uma Assembleia de Funcionários da Câmara Municipal de Tavira “de todas as classes e categorias (secretaria, tesouraria, obras, fiscalização, matadouro, serviços externos, etc.”[31], com o objetivo de eleger um representante para a Comissão Distrital que iria trabalhar na organização do Sindicato Nacional dos Funcionários Civis e Administrativos do Estado.

Os funcionários da Câmara Municipal de Tavira presentes resolveram nomear o seu representante “democraticamente e por escrutínio secreto”[32], tendo a escolha recaído no Chefe de Secretaria, Manuel José Romana Martins, decisão votada por unanimidade e esclarecida pela respetiva Assembleia através do seguinte comunicado:

 “Ao tomarem esta decisão, desejam os funcionários da Câmara Municipal de Tavira, no actual momento que o País atravessa em que se houve e lê com certa insistência o pedido de demissão de directores e chefes de diversos departamentos e serviços, manifestar ao seu chefe de secretaria de diversos departamentos e serviços, manifestar ao seu Chefe de Secretaria Sr. Manuel José Romana Martins, o total apoio e confiança de todos, podendo continuar a contar com o maior carinho, colaboração desinteressada e firme vontade de o ajudar no prosseguimento da obra em que tem sido trabalhador incansável para o bem comum e progresso do nosso concelho. Nesta manifestação, sincera e voluntária, ainda é justo realçar o facto do Sr. Romana Martins que não sendo de Tavira e somente aqui trabalhando há cerca de dois anos, ter dado o maior esforço, inteligência e grande vontade, muitas vezes com prejuízo da sua vida particular, na defesa dos interesses de Tavira e dos seus subordinados, como se nosso conterrâneo fosse.”[33]

Também os magistrados, a notária, a conservadora e os funcionários do Palácio de Justiça de Tavira, “integrados no movimento de democratização levado a cabo pelas Forças Armadas” [34] reuniram-se em assembleia plenária, no dia 16 de maio, onde elaboraram um caderno reivindicativo que foi amplamente divulgado na imprensa local. 

A 21 de maio, realizou-se uma reunião extraordinária do Grémio do Comércio dos Concelhos de Tavira, Vila Real de Santo António, Castro Marim e Alcoutim, com o objetivo de discutir o “futuro do Grémio como entidade representativa duma classe em autêntica liberdade democrática”[35]. Segundo a imprensa da época, esta reunião seria então “a mais ruidosa das assembleias”[36], tendo sido difícil, “qualquer interveniente fazer-se ouvir em silêncio aprovar-se qualquer proposta ou chegar-se a conclusões”[37], tendo sido deliberado pelos presentes “realizar, no prazo de 30 dias, nova assembleia para recolha de nomes”[38], que iriam constituir a Comissão Administrativa desta entidade.

Fig. 4 – Convocatória para a primeira Assembleia Geral do Grémio do Comércio dos Concelhos de Tavira, Vila Real de Santo António, Castro Marim e Alcoutim, após o “25 de Abril” (Fonte: Povo Algarvio)

Além destas, muitas manifestações e reuniões políticas, sociais e reivindicativas tiveram lugar na cidade e no concelho de Tavira, com destaque para o sector do comércio e serviços, por serem as atividades com maior peso na economia local da época, como consequência disso, reuniram-se na noite de dia 24 de maio, no Salão do Quartel dos Bombeiros os empregados do comércio e dos serviços do Concelho de Tavira, “com a presença de dirigentes sindicais vindos de Faro”[39], com a finalidade de “nomear uma comissão concelhia para representar a classe junto do Sindicato, em Faro”[40], esta comissão ficaria constituída por: “Maria José Pereira Ramos (comércio), Rita Cristo (Comércio), Silvino Mário Oliveira (escritório), Lino Manuel Bento (comércio), Vítor Pereira (escritório) e Manuel Martins Bagarrão (escritório) a qual apresentou as suas reivindicações aprovadas por aclamação”[41].

Também os empregados dos Aldeamentos Turísticos Pedras D’El Rei, reuniram-se nestes dias após o “25 de Abril”, a reunião teve lugar no Salão de Festas do Clube Recreativo Tavirense, “a fim de se apresentarem à Administração certo número de reivindicações e exigir a readmissão do pessoal despedido pelo Direção”[42] e “devido à ausência da Administração foi caso dos despedimentos entregue ao respetivo Sindicato de Hotelaria”[43].

Com a democracia a funcionar, a pluralidade partidária iria ser uma realidade em contraponto ao anterior regime de partido único.

Em Tavira, após o MDP/CDE, organiza-se um núcleo do Partido Socialista com três figuras de relevo: Gilberto Ferro, Eduardo Mansinho e Francisco M. Pereira, que integram a Comissão Instaladora deste partido no Algarve[44] e o Partido Comunista Português, começa a “sair da clandestinidade”, em que se encontrava no antigo regime, do qual se pode dizer, o seu maior opositor, e de onde existiram as maiores ações de resistência e combate político e passa a ser um dos partidos mais importantes da nossa democracia plural.

Fig. 5 – Partido Comunista Português (PCP), Partido Socialista (PS), Movimento Democrático Português (MDP/CDE), foram os partidos mais ativos e com núcleos organizados em Tavira nos primeiros meses pós-25 de Abril

O mês de Maio de 1974, ficou ainda marcado por perseguições a supostos membros da então recém extinta polícia política, a PIDE/DGS, tanto que a Câmara Municipal de Tavira, recebe vários pedidos, para que sejam emitidos certificados comprovativos de que não pertença a esta entidade, sobretudo como informadores. A Câmara Municipal de Tavira, por não ter capacidade de dar uma resposta a estes pedidos, solicita ao Comandante Territorial do Algarve se é possível, dar seguimento a estes pedidos, ao qual é sempre respondido que “não é norma deste Comando não passar qualquer certificado de não ligação com a extinta DGS em virtude de não ser possível a confirmação das declarações de interessados”.[45]

O mês de Maio de 1974 foi muito intenso em Tavira, foi o mês do despertar do povo para a democracia e das suas potencialidade, na luta pela melhoria das condições de vida das populações e para o desenvolvimento local, mas esta história ainda estava a começar, e os dias quentes do Verão iriam continuar a ser quentes, e o ambiente social e político também seriam assim, como iremos ver no próximo capítulo.

 



[1] JORNAL “O TAVIRA”, Nº 30, 16/05/1974, ANO II

[2] POVO ALGARVIO, Nº 2081, 4/05/1974

[3] ARQUIVO MUNICIPAL DE TAVIRA, Pasta 1B: Correspondência Governo Civil (janeiro de 1974 a dezembro de 1974)

[4] JORNAL “O TAVIRA”, Nº 30 16/05/1974

[5] JORNAL “O TAVIRA”, Nº 30 16/05/1974

[6] POVO ALGARVIO, Nº 2081, 4/05/1974

[7] JORNAL “O TAVIRA”, Nº 29, 2/05/1974

[8] ARQUIVO MUNICIPAL DE TAVIRA, Pasta 1B: Correspondência Governo Civil (janeiro de 1974 a dezembro de 1974)

[9] ARQUIVO MUNICIPAL DE TAVIRA, Pasta 1B: Correspondência Governo Civil (janeiro de 1974 a dezembro de 1974)

[10] ARQUIVO MUNICIPAL DE TAVIRA, Pasta 1B: Correspondência Governo Civil (janeiro de 1974 a dezembro de 1974)

[11] JORNAL “O TAVIRA”, Nº 30 16/05/1974

[12] ARQUIVO MUNICIPAL DE TAVIRA, Pasta 1B: Correspondência Governo Civil (janeiro de 1974 a dezembro de 1974)

[13] ARQUIVO MUNICIPAL DE TAVIRA, Pasta 1B: Correspondência Governo Civil (janeiro de 1974 a dezembro de 1974)

[14] ARQUIVO MUNICIPAL DE TAVIRA, Pasta 1B: Correspondência Governo Civil (janeiro de 1974 a dezembro de 1974)

[15] JORNAL “O TAVIRA”, Nº 30 16/05/1974

[16] JORNAL “O TAVIRA”, Nº 30 16/05/1974

[17] ARQUIVO MUNICIPAL DE TAVIRA, Pasta 1B: Correspondência Governo Civil (janeiro de 1974 a dezembro de 1974)

[18] JORNAL “O TAVIRA”, Nº 30 16/05/1974

[19] ARQUIVO MUNICIPAL DE TAVIRA; Livro de Atas da Câmara Municipal de Tavira (1976-1977), Lv. 64, Ata Nº 12/76, 22 de junho de 1976, Fls. 170

[20] CHAGAS; Ofir (2015); História de Tavira: Volume II - Estado Novo – Democracia, Edição de Autor, p. 174

[21] JORNAL “O TAVIRA”, Nº 30, 16/05/1974

[22] JORNAL “O TAVIRA”, Nº 29, 2/05/1974

[23] JORNAL “O TAVIRA”, Nº 30 16/05/1974

[24] JORNAL “O TAVIRA”, Nº 30 16/05/1974

[25] JORNAL “O TAVIRA”, Nº 30, 16/05/1974

[26] JORNAL “O TAVIRA”, Nº 30, 16/05/1974

[27] POVO ALGARVIO, Nº 2082, 11/05/1974

[28] POVO ALGARVIO, Nº 2082, 11/05/1974

[29] JORNAL “O TAVIRA”, Nº 30, 16/05/1974

[30] JORNAL “O TAVIRA”, Nº 30, 16/05/1974

[31] POVO ALGARVIO, Nº 2083, 18/05/1974

[32] POVO ALGARVIO, Nº 2083, 18/05/1974

[33] JORNAL “O TAVIRA”, Nº 30, 16/05/1974, ANO II

[34] POVO ALGARVIO, Nº 2084, 25/05/1974

[35] JORNAL “O TAVIRA”, nº 30, 16/05/1974

[36] JORNAL “O TAVIRA”; nº 31, 30/05/1974

[37] JORNAL “O TAVIRA”; nº 31, 30/05/1974

[38] JORNAL “O TAVIRA”; nº 31, 30/05/1974

[39] JORNAL “O TAVIRA”; nº 31, 30/05/1974

[40] JORNAL “O TAVIRA”; nº 31, 30/05/1974

[41] JORNAL “O TAVIRA”; nº 31, 30/05/1974

[42] JORNAL “O TAVIRA”; nº 31, 30/05/1974

[43] JORNAL “O TAVIRA”; nº 31, 30/05/1974

[44] JORNAL “O TAVIRA”, nº 30. 16/05/1974

[45] [45] ARQUIVO MUNICIPAL DE TAVIRA, Pasta 1B: Correspondência Governo Civil (janeiro de 1974 a dezembro de 1974)