Por: Padre Carlos Aquino | effata_37@hotmail.com

“Feliz daquele que Tu escolhes e atrais, para viver nos teus átrios. Seremos saciados com a beleza da tua casa, com a santidade do teu templo” (Salmo 65,5). Estas palavras orantes exprimem profundamente a alegria que invade os corações dos cristãos ao reabrirem depois de um longo tempo de vasta e profunda intervenção a Igreja Matriz de Loulé que tem por orago São Clemente, o quarto Papa da História da Igreja, que foi martirizado pela sua fidelidade a Jesus Cristo.

É com enorme júbilo que vemos reabrir este espaço Sagrado, uma vetusta casa da Igreja edificada na segunda metade do século XIII, sendo um dos mais significativos testemunhos da arquitetura gótica na região do Algarve.

Este é, na verdade, um espaço identitário, uma bela e grandiosa casa onde se aviva a memória de uma história, de uma cultura e de um povo crente. Uma Igreja é sempre uma representação humana do divino.

Deus não necessita de uma casa para habitar, porque “os verdadeiros adoradores hão-de adorar o Pai em espírito e verdade”. Mas a condição humana necessita de uma representação. Assim a casa de Deus torna-se a casa dos homens peregrinos, a casa onde a fonte e a sede coincidem, a casa que se constrói para que a eternidade a habite. Não podemos e não devemos esquecer que esta casa constitui um sinal peculiar da Igreja que peregrina na terra e uma imagem da Igreja que habita no Céu.

É a assembleia reunida que qualifica o espaço tornando-o um espaço vivente e mistagógico, que remete para o Mistério que o habita. Por isso mesmo, a casa da Igreja torna-se um lugar celebrativo que interpela, um lugar influente e de Encontro, um lugar significante, que diz Deus e comunica e manifesta a Sua presença.

Construir ou reconstruir uma Igreja, exige sempre que se desenhe e promova esta identidade. O espaço litúrgico é um lugar simbólico na medida em que a sua linguagem nos fala de uma outra realidade: a do mistério de Cristo, significativamente presente na mesa do sacrifício, o Altar e no Ambão, lugar para a proclamação da Palavra. A Liturgia nos seus ritos e a casa são epifanias de Deus connosco.

É isso que faz da Igreja um lugar de Memória, espaço do Mistério, casa de oração e de visão do céu aberto, da nova Jerusalém. Para ser uma Casa de pedras vivas unidas à Pedra angular, o lugar sagrado cristão deve ser um lugar de passagem e de subida, de conversão e mudança, de renascimento e de progresso a uma vida nova, um lugar de testemunhas e de missão.

Por isso também lugar de contemplação onde se possa ouvir a respiração de seda do silêncio, de escutar a Palavra que é Luz para todos os nossos caminhos, de experimentar a comunhão, a fraternidade e a partilha onde se refaz e refloresce a vida. “A casa de Deus está assente no chão/ Os seus alicerces mergulham na terra/ A casa de Deus está na terra onde os homens estão/ Sujeita como os homens à lei da gravidade/ Porém como a alma dos homens trespassada/ Pelo mistério e a palavra da leveza/ (…)/ Situada no tempo/ Para habitação da eternidade/ Aqui procuramos pensar reconhecer/ Sem máscara ilusão ou disfarce/ E procuramos manter nosso espírito atento/ Liso como a página em branco// Aqui para além da morte da lacuna da perca e do desastre/ Celebramos a Páscoa// Aqui celebramos a claridade/ Porque Deus nos criou para a alegria” (Sophia de Mello Breyner Andresen, Obra Poética. Páscoa de 1990)