Por: Padre Carlos Aquino | effata_37@hotmail.com

“Antes que saísses do seio de tua mãe, Eu te consagrei e te constituí profeta entre as nações” (Jer 1,5). Todos os anos o esperado e luminoso tempo do Verão inicia com as grandes festividades populares dedicadas aos Santos António, João e Pedro. Bailaricos e sardinhadas recriam bairros e alargam as famílias na alegria. Vencem-se rotinas e abrem-se janelas à música e à beleza da vida não circunscrita ao automatismo quotidiano.

O perfume dos manjericos e a poesia unge e une as almas. Creio que nunca se perguntou às sardinhas se ficavam satisfeitas pela sua imolação em honra dos consagrados de Deus. Seria necessário um milagre para as ouvir falar.

Mas creio, também, que nunca se perguntou ao povo, reunido em festa, se conhece a identidade e a vida desses que são a causa da festa. Esta não é hora de milagres! Sabe-se e saboreia-se as sardinhas dos Santos, mas poucos saberão dizer, na verdade, quem foi António, João e Pedro, homens de Deus e profetas.

Pouco interessará como justificação para um dia feriado a sua santidade e a motivação da sua vida. Dos que se afirmam religiosos e até cristãos, são poucos os que conhecem as suas vidas, ainda que por motivos culturais, sabendo falar da importância dos mesmos na História que avança. E o mesmo se diga dos que se afirmam não religiosos, mas a quem dá muito jeito um feriado para folgarem, repousando do trabalho e descansarem o espírito, aproveitando um tempo em família. Para quem promove a festa o importante é que se consuma, haja sardinhas e bailarico e os santos ajudem no milagre de boa receita.

Para quem nela participa, que seja bem animada, se gaste pouco e haja muita diversão. Que interesse terá saber quando se baila, que António de lisboa ou de Pádua, nascido nos finais do século XII e falecido no já longínquo ano de 1231 tinha por nome Fernando de Bulhões?

Que foi Presbítero e é considerado doutor da Igreja, um cónego regular que ingressou na Ordem dos Menores para se entregar à propagação da fé entre os povos de África, mas que acabou por exercer com muito fruto o seu ministério da pregação da Palavra de Deus na Itália e na França? Que é autor de grandes Sermões impregnados de doutrina e suavidade da fé, um português maior? Saboreando sardinhas, que interesse terá saber que João, filho de Isabel, descendente de Aarão e do sacerdote da classe de Abias, chamado Zacarias, é nome que lhe foi dado por mensageiro divino e significa “Deus concede a graça”? Que Ele foi o precursor do Messias e profeta, tendo-o batizado no rio Jordão e sido morto por Herodes na fidelidade à Verdade e à Palavra justa de Deus? E que interessa saber que Simão de Betsaida, filho de Jonas e irmão de André, pescador da Galileia foi chamado por Jesus e por Ele tornado Apóstolo, sendo o primeiro entre os discípulos a confessar que Jesus era o Cristo, Filho de Deus vivo, por quem foi chamado de Pedro? Que morreu crucificado na fidelidade ao Senhor tendo sido por Ele escolhido como pedra singular na edificação da Sua Igreja? Saboreando as sardinhas dos Santos, ainda lembrados, mas na maioria da gente desconhecidos, dançaram na minha lembrança as palavras de uma mulher maior: “Perenidade/ Mesmo depois do Tempo/ ficaremos no coração aberto dos que amamos.// E no grande silêncio que restar/ na ausência dos gestos e do olhar/ ainda assim estaremos/ e seremos.// Mesmo depois do Tempo/ quando formos lembrança evanescente/ seremos outra forma de presença/ porque o amor subsiste/ eternamente”. (Fernanda Seno).