Por: Padre Carlos Aquino | effata_37@hotmail.com

“O Espírito do Senhor está sobre mim, porque Ele me consagrou com a unção, para anunciar a Boa notícia aos pobres” (Lc 4, 18).  Nestes últimos tempos os padres da Igreja Católica têm sido os grandes protagonistas duma informação nem sempre bem informada, justa e de serviço à verdade, geradora não raras vezes de equívocos e preconceitos. Importa mais o mediatismo dos casos, o escândalo público de uma Igreja e dos seus servidores primeiros, que deixaram de ser casa e homens de Deus, do que a intransigente defesa da dignidade humana e o escrutínio da verdade.

Vivemos tempos profundamente exigentes também para a identidade e missão dos padres. A flexão do substantivo não pode e não deve ser trazido à praça pública sublinhando-se que esta gente é perversa, tarada sexual, oprimida, hipócrita, retrógrada e indispensável a tudo o que se deseja edificar sem fundamentos do religioso e da fé, pouco significativos para a liberdade, o progresso e o desenvolvimento que se almejam. São poucos, de facto, os que falam e entendem sobre o seu mistério.

Para a maioria até dos que se dizem praticantes e fiéis, o misterioso é apenas reservado aos internos jogos palacianos, ao desejo do poder, às guerras internas entre clericalistas, conservadores, progressistas e revolucionários. E como se empobrece sem a verdade o seu mistério e o seu ministério! Fala-se tanto dos padres, generalizando-se atitudes reprováveis e abominais de alguns, mas que importância assumem os padres para este tempo e este novo mundo em construção? Sou Padre! Em nome dos que procuram ser humildes trabalhadores da vinha do Senhor, homens chamados do povo santo de Deus, mas homens livres e profetas, que procuram ser sal e luz, não me envergonho de testemunhar e escrever: Um Padre é um dom.

Ele assume o risco de uma entrega em obediência livre procurando viver com os mesmos sentimentos de Jesus Cristo. Sabe que é ungido pela Graça e por amor no Espírito para ungir. Ao ser um homem de Deus, consagrado a Ele para servir, não por razões de carne ou de sangue, ele sabe que só a fé que o move dá sentido pleno à sua existência e missão. Ser padre é aceitar “morrer” ainda em vida, acreditando que a vida deste mundo tem tanto mais sentido e valor quando é colocada ao serviço da vida eterna. Um padre é presença sacramental de Cristo neste mundo colocando toda a sua vida e amor ao serviço da Boa e Bela Notícia, que ilumina e cura os pobres, os cegos, os mendigos e oprimidos. O seu coração e toda a sua vida são dom e bálsamo do Evangelho para os curvados deste tempo pelo peso das necessidades e feridas.  

A sua linguagem não é inapropriada e os seus gestos de ternura não possuem e sacrificam. Um padre é mistério dessa unção de Deus para sujar as suas mãos tocando e curando feridas, pecados, amarguras, perfumando as mãos e o coração levando a fé, a esperança. Nesta hora de purificação, de vigilância e de desafio, partilho com todos os irmãos padres esta bela palavra dum homem de Deus: “Vigiar/ desafiai o deserto/ a fuga mundi/ a desistência//arrancai do caos/ o canto livre//deixai a prisão/ que pisa aos pés a vida/ em nome da pós-vida// entrai no abismo do silêncio/ que ilumina//esclarecei a distância/ entre o poder e as verdades// pensai o acontecimento/ a exceção, a mudança//entrai no Aberto/ que a Palavra tece//querei o não-querer/ que faz o pobre// largai a técnica/da autoflagelação/e do cálculo//o claro está no escuro/e na limitação passiva/do que nele fulgura/e leva ao Dia//meditai na vida/não na morte//a Páscoa está na dor/que ressuscita/” (Fr. José Augusto Mourão op.)