Nada mudou na vida de Rui Oliveira apesar do ouro no madison em Paris2024, com o ciclista português a revelar à Lusa que, seis meses depois, ainda não assimilou totalmente o facto de ser campeão olímpico.
“Acho que não mudou nada. Continuou praticamente tudo igual”: a resposta do ciclista da UAE Emirates pode surpreender quem o ouve, mas o corredor esclarece prontamente que, apesar de haver mais pessoas a reconhecê-lo na rua, a sua vida pessoal permanece a mesma.
Seis meses depois de ter subido ao lugar mais alto do pódio, ao lado de Iúri Leitão, no velódromo de Saint-Quentin-en-Yvelines, Rui Oliveira ainda se está a adaptar à sua nova realidade, nomeadamente ao facto de alguns colegas o tratarem por ‘campeão olímpico’, uma menção que “soa um bocadinho diferente” e à qual não está habituado.
“Mas é bom. Foi tudo tão rápido, foi tudo tão inesperado que ainda custa um bocadinho assimilar, mas já se vai tornando real”, pontuou.
O ouro olímpico visivelmente não mudou o gaiense, de 28 anos, que está agora num Olimpo de históricos do desporto português.
“Toda a gente conhece Rosa Mota, Carlos Lopes, Fernanda Ribeiro. Todos os nossos campeões olímpicos ficaram na história de Portugal, porque obviamente não são muitos, e, agora, tendo conseguido isso com o Iúri, também acho que vai ficar presente, ainda por cima nesta era das redes sociais, dos media”, prognosticou.
Rui Oliveira sentiu o impacto desta nova era mediática desde que conquistou o ouro, no final de tarde de 10 de agosto, nem que seja por ter recebido os parabéns do seu ídolo, o futebolista Cristiano Ronaldo.
“Até foi uma das primeiras coisas que vi quando fomos ao telefone, que tínhamos lá a menção dele [Ronaldo], mas obviamente é online e não é presencial. Mas, quando estivemos com ele [após um jogo da seleção portuguesa], foi muito bom ouvir que ele tinha muito orgulho no feito que tínhamos conquistado e que percebia o feito que era enormíssimo”, revelou à agência Lusa.
Mas, ao contrário de Leitão, o ciclista da UAE Emirates não pôde festejar descontraidamente a sua conquista, uma vez que tinha compromissos na estrada com a sua equipa.
“Obviamente, ele tinha mais espaço para estar mais presente em alguns programas ou em algumas festas, por assim dizer. E eu tinha um calendário mais preenchido, com mais corridas. E isso, claro, não me permitiu tanto estar presente”, justificou.
No entanto, Oliveira entende que “o ciclismo é um desporto diferente”, pois a época não culmina com os Jogos Olímpicos,
“Sendo ciclista de estrada, tenho os compromissos com a estrada e não posso estar a desfrutar do que é a medalha. [...] Se fosse no final da época, estivesse um mês ou dois de repouso, seria espetacular, podia desfrutar um pouco mais. Mas, sim, é um pouco… não tenho pena, é o que é”, afirmou.
E nem quando a temporada acabou o gaiense conseguiu ter as merecidas férias, já que foi operado à clavícula e ao nariz.
“Fui para o estágio de equipa em Abu Dhabi, após acabar os Mundiais de pista, e tive a operação logo, mal cheguei, e foi recuperar essas duas, três semanas, cheio de dores, e depois começar a treinar. Portanto, praticamente, não tive férias”, contou.
O sacrífico, contudo, valeu a pena, já que nos Europeus da passada semana se sagrou vice-campeão europeu de eliminação e conquistou o bronze ao lado do gémeo Ivo no madison.
“Fizemos ver que em todas as disciplinas que entrámos, vencemos uma medalha, com praticamente nenhum tempo de preparação, só com um ou dois treinos na pista até aqui. E estar outra vez a lutar contra as melhores nações do mundo, ganhar seis medalhas, acho que dá para ver que tem valido a pena o esforço”, defendeu.
Oliveira está ciente de que, perante estes feitos, os portugueses estão a habituar-se aos metais dos pistards nacionais.
“A pressão vai estar sempre para ganharmos medalhas, e quando não conseguimos as pessoas ficam desiludidas, mas uma pessoa sabe o que é custa chegar a este patamar, e o mais importante é as pessoas perceberem de onde é que nós vimos, o quão difícil é ganhar medalhas. Têm de ver que nada cai do céu e o que fazemos para chegar a estas competições e lutar pelas medalhas já é muito”, realçou.

 


 

 
A vitória na estrada é o que falta a Rui Oliveira
 
A Rui Oliveira só falta a primeira vitória na estrada, o grande objetivo que o ciclista português da UAE Emirates delineu para uma temporada na qual terá mais liberdade para sprintar para si.
“Falta a primeira vitória, porque já são muitos segundos [lugares] nestes últimos anos. Ainda falta levantar os braços, e é só mesmo isso que falta, portanto, vamos continuar a tentar”, confessou o gaiense.
Seis meses depois de se ter sagrado campeão olímpico de madison, ao lado de Iúri Leitão, Rui Oliveira aspira a estrear o seu palmarés em elites na estrada, tendo já hoje uma oportunidade para o fazer na chegada da terceira etapa da 51.ª Volta ao Algarve em Tavira, onde no ano passado foi batido por meros centímetros pelo ‘gigante’ Wout van Aert (Visma-Lease a Bike).
“Esteve quase no ano passado, foi por pouco em Tavira, mas este ano o objetivo mantém-se. Este ano temos mais uma chegada também a Faro, que, se calhar, é capaz de chegar ao sprint. Mas na terceira [etapa] vou tentar lutar pela vitória. Obviamente, estando aqui no Algarve é uma motivação extra. Dá-me sempre um bocadinho de extra força, portanto, vamos ver se corre bem”, perspetivou.
Nesta ‘Algarvia’, o corredor de 28 anos, que normalmente é o principal lançador de Juan Sebastián Molano, terá a liberdade para sprintar, algo que se estenderá a outras provas da temporada, nomeadamente ao Tirreno-Adriático (10 a 16 de março), onde estará após alinhar na Kuurne-Bruxelas-Kuurne.
“Depois, tenho as clássicas da Bélgica até à [Volta à] Flandres, até [ao Paris] Roubaix e é por aí”, enumerou.
Fora do calendário de Rui Oliveira para 2025 está, para já, qualquer grande Volta, uma opção da qual o português até não desgosta.
“Às vezes, não significa que ir a uma grande Volta seja melhor. Numa equipa como a nossa, há poucas oportunidades para ir ao sprint, porque temos sempre um líder enorme na equipa. Temos de trabalhar, perdemos muita força em etapas que temos de tirar [puxar] e chegamos sem força ao sprint. Portanto, mais vale fazer durante aquele mês três ou quatro corridas de menor dimensão e tentar vencer uma corrida, isso é mais importante”, explicou.
Com três participações na Vuelta e duas no Giro no currículo, o campeão olímpico em Paris2024 reconhece que estar numa ‘grande’ é “sempre uma grande motivação”, mas insiste que não é uma coisa que esteja “muito” na sua cabeça.
“É mais ter a oportunidade e liberdade para fazer os sprints em corridas menores e tentar ganhar, é esse o objetivo”, reforçou.
O ciclista da UAE Emirates acredita mesmo que o seu ouro na capital francesa contribuiu para reforçar a sua confiança na estrada, algo que sentiu já na fase final da época passada.
“Já notei um pouco isso depois na segunda fase da época. Depois dos Jogos, na estrada, sentia-me bastante confiante, sentia-me bastante bem. Estive perto também de ganhar algumas corridas. Portanto, sim, isso deu-me bastante confiança, estou muito mais aliviado, mas, claro, falta esta vitória na estrada que procuro”, concluiu.
 
Lusa