Por Ricardo Proença Gonçalves

É uma condição necessária para o desenvolvimento de um país e das suas regiões, que as suas populações sejam saudáveis e se encontrem bem de saúde.

Nos últimos 40 anos, desde a criação do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e do Sistema de Saúde Português, têm havido melhorias significativas na saúde e na qualidade de vida dos cidadãos. Um dos progressos assinaláveis e facilmente observado, é o aumento da esperança média de vida.

O aumento da esperança média de vida é um indicador claro da importância e do valor que a saúde e o bem-estar têm no desenvolvimento económico das sociedades modernas.

Vejamos um exemplo em concreto. Segundo dados do Pordata, em 1970, em média, um português tinha uma esperança média de vida de 67 anos (idade). Em 2020, a esperança média de vida era de 80,7 anos (idade). Isto também ocorreu derivado ao facto de o gasto médio, por pessoa, do SNS aumentar de 34,2€ em 1982 para 1.186,80€ em 2020, ou seja, tem havido um enorme investimento no que toca à valorização do bem-estar e saúde das populações, difundindo assim uma melhoria dos padrões de qualidade de vida.

Contudo, centremos este texto no contexto atual que o SNS se encontra.

O SNS tem apresentado algumas ineficiências nos últimos anos, e essas ineficiências podem, num curto espaço de tempo, pôr em causa todas a melhorias de saúde conquistadas nos últimos 40 anos.

Existem atualmente dificuldades que nos levam a questionar se o SNS se encontra efetivamente preparado para os desafios do futuro e para as futuras gerações.

As doenças de hoje não são as mesmas de há 40 anos atrás. Até mesmo o atual perfil do utente no SNS, em nada se compara com os utentes do SNS de há 40 anos atrás. Já não existem. As necessidades são outras. O mundo mudou e com ele surgiram muito mais doenças crónicas que criaram novos desafios na saúde.

Um dos desafios que deixa alguma preocupação é a atual falta de acesso aos cuidados de saúde. Existem atualmente dificuldades de acesso a cuidados primários, que são a primeira linha de defesa para a prevenção de doenças e para a promoção do bem-estar geral das populações. E como é do conhecimento geral, uma sociedade doente não consegue garantir prosperidade para a economia onde se encontra inserida e é parte integrante do sistema que mantém essa economia em funcionamento.

Um outro desafio que o SNS atravessa é a sua ineficiência na gestão dos recursos que tem à sua disposição.

Desde logo, problemas em gerar melhorias de produtividade, que já se encontram há mais de duas décadas diagnosticados, originando assim dificuldades em haver, por exemplo, carreiras profissionais atrativas no setor público da saúde.

É consensual na sociedade portuguesa que existem no SNS profissionais de saúde de excelência e é ainda mais consensual garantir que estes continuem a operar no SNS.

Uma problemática mais técnica de gestão presente no SNS é a inexistência de um sistema adequado de monitorização e avaliação de desempenho dos indicadores de gestão do SNS, e, portanto, chega-se a uma conclusão muito simples e básica em gestão: o que não se mede, não se gere.

Portanto, não são novidade nenhuma as principais e inquietantes conclusões do relatório publicado recentemente pelo Conselho de Finanças Públicas sobre a evolução (ou a falta dela) do Desempenho do Serviço Nacional de Saúde no ano de 2021, onde a sustentabilidade económico-financeira do SNS poderá no futuro pôr em causa o serviço público de saúde e o desempenho assistencial às populações.

Ora se já nos encontramos numa situação onde existem dificuldades no acesso a cuidados de saúde, imagine-se se futuramente o sistema económico-financeiro do SNS tenha a infelicidade de colapsar.

É claro que este é um cenário adverso, e estamos em crer que o mesmo não irá ocorrer.

No entanto, se não planearmos adequadamente agora quais os novos caminhos a seguir para garantir a sustentabilidade económico-financeira do SNS, continuaremos a ter défices de 1,1 mil milhões de euros, desvios orçamentais e desequilíbrios económicos que poderão pôr em causa a principal missão do SNS.

Face a toda a contextualização anterior, concentremos o final deste texto num conjunto de soluções que poderiam convalescer o desempenho do SNS nos próximos anos. Soluções essas que passariam por:

  1. Uma gestão centrada em princípios de Value-Based Health Care, isto é, cuidados de saúde baseados em valor. Medindo os resultados em saúde alcançados pelos custos de entrega desses resultados. O Sistema de Saúde da Alemanha tem nos últimos anos implementado no seu sistema de saúde estratégias neste sentido.
  2. Promover um sistema adequado de monitorização e avaliação de desempenho, permitindo assim um controlo a longo prazo de vários indicadores de gestão financeiros e não-financeiros.
  1. Implementar uma política de valorização dos Recursos Humanos no SNS. Permitindo que as Administrações Hospitalares tracem objetivos próprios para as suas equipas multidisciplinares e de acordo com as necessidades mais críticas das suas áreas de atuação. Podendo haver incentivos financeiros de acordo com os objetivos alcançados e garantindo desta forma uma carreira onde haja progressão.
  2. Transformação digital em Saúde, essencial para que a tomada de decisão seja mais célere, tanto a nível da gestão administrativa, como em termos clínicos. Através da implementação de aplicações digitais adaptadas, poderá se desmaterializar e homogeneizar informação que atualmente se encontram dispersa em múltiplas ferramentas informáticas.

A boa gestão resulta. Quem o diz é o Tribunal de Contas que no seu Relatório Síntese de abril de 2021 acerca das Parcerias Público-Privadas (PPP) no SNS, refere que as PPP em saúde geraram poupanças para o Estado e na componente da gestão hospitalar, esta fora genericamente mais eficiente do que a média dos hospitais de gestão pública comparáveis, garantindo assim um desempenho de referência em indicadores de qualidade, eficácia e de acesso a cuidados de saúde.

É essencial ter consciência de que todas as ineficiências e dificuldades que o SNS atravessa atualmente não se reformam apenas com as soluções anteriormente referenciadas, nem tão pouco no curto prazo. Ainda assim é urgente tomar ação agora, para se garantir que o SNS no futuro possa principalmente salvaguardar a saúde e bem-estar das gerações vindouras, para que estas possam também ter garantias de um futuro com qualidade de vida.

 

Sobre o autor: Ricardo Proença Gonçalves é licenciado em Gestão de Empresas e Pós-Graduado em Gestão de Unidades de Saúde, pela Faculdade de Economia da Universidade do Algarve. Detém também um Executive Program em Controlo de Gestão e Avaliação de Performance pela Nova SBE. É igualmente membro estagiário da Delegação Regional do Algarve da Ordem dos Economistas e membro do think tank – Thinking Algarve.