Por Luís Pina | Licenciado em Acessoria de Administração | aragaopina59@gmail.com

ENTREVISTA |  MÁKINA DE CENA

A Mákina de Cena é uma Associação Cultural que pretende vocacionar o seu trabalho no campo das artes performativas e alargá-lo a outras áreas e disciplinas criativas, promovendo a transversalidade e interdisciplinaridade nos seus projetos.

Como coletivo heterogéneo, conjuga várias artes, saberes e linguagens. Por um lado, pretende construir, desenvolver e divulgar criações artísticas através da produção de espetáculos e eventos de diferentes formatos; por outro, está profundamente interessada em desenvolver um trabalho interventivo, inclusivo e consequente, ao estabelecer um diálogo com a comunidade em que se insere, através de iniciativas de formação, informação e promoção das artes e da cultura local, sempre promovendo a transversalidade artística e o estabelecimento de parcerias com outras entidades culturais (locais, nacionais e internacionais).

A Associação tem de Direção Artística de Carolina Santos (Teatro), criadora de formação multidisciplinar licenciada em Arquitetura (U. Coimbra, 2008), com Mestrado em Teatro (U. Évora, 2013) e formação especializada na conceituada École Internationale de Théâtre Jacques Lecoq (Paris, 2017). Conta com diversas colaborações enquanto intérprete, cenógrafa e formadora em estruturas nacionais e internacionais, com destaque para a Cia. Philippe Genty, numa digressão de 3 anos (2012/15) pela Europa e Ásia, Cia. Plexus Polaire, La Possible Échapée e First Round ICP, da qual é membro fundador. Sedeada no Algarve desde 2018, integrou a equipa de produção da DeVIR/CAPa e cofundou a Mákina de Cena, onde dirige a MdC Teatro e o Clube de Leitura Teatral de Loulé.

Marco Martins (Jazz) é músico (baixista) e compositor de Jazz, desenvolve paralelamente trabalhos nas áreas do teatro/dança, artes gráficas e produção, nomeadamente como músico em cena, sonoplastia/composição, design gráfico, comunicação e assistência de produção. Mestre em Perfomance Jazz - Baixo Eléctrico, pela Escola Superior de Música de Lisboa, conta igualmente com a licenciatura em Jazz – Baixo Eléctrico na Univ. de Évora, e com um curso profissional de Gestão e Produção de espetáculos. Docente de contrabaixo no Conservatório de Música de Loulé desde 2019. Formador em Jazz (contrabaixo, baixo, combo), é membro fundador da Mákina de Cena e o criador da primeira formação regular em Jazz e Música Improvisada de Loulé e do CAL Jazz Colective, coletivo de músicos profissionais de Jazz do Algarve Central.

 

V.A. - Quando apareceu a Mákina de Cena? O que motivou o seu surgimento?

MC - A Mákina de Cena tem a sua fundação oficial a 9 de março de 2018.

O seu surgimento deve-se, sobretudo, à nossa vontade em ter uma estrutura para produzir as nossas criações, na área do teatro e da música jazz. Claro que, uma vez que começámos a desenhar este projeto, percebemos que afinal queríamos fazer muito mais coisas e que era necessário encontrar o invólucro certo, digamos assim, que pudesse albergar não apenas a criação, mas também formação, programação, mediação, nas suas várias vertentes artísticas.

O objeto oficial da Mákina ficou então definido para estabelecer e fomentar a criação das artes performativas no concelho de Loulé, e a sua consequente itinerância regional e nacional, dando visibilidade ao(s) objeto(s) artísticos que por aqui se produzem.

De igual modo, e na sequência do trabalho que a Mákina de Cena tem vindo a desenvolver desde a abertura da Casa da Mákina, pretendemos também estimular os intérpretes locais e formar novos intérpretes, estimulando a comunidade para práticas artísticas, nomeadamente performativas/teatrais e/ou musicais, e ativamente formar novos públicos pela apresentação de propostas artísticas diferenciadoras e apelativas.

 

V.A. - Porque escolheram a cidade de Loulé?

MC - Loulé é a terra natal de um dos impulsionadores deste projeto: Marco Martins, assim como de vários membros da nossa direção.

Ao voltarmos de Paris, escolhemos Loulé por razões familiares, levando a que fosse também aqui que “instalássemos” a Mákina que, na verdade, sempre foi um dos nossos projetos de vida.

 

FOTO- Carolina e Marco ©Martim Santos

V.A. - Apesar da pandemia, a Mákina de Cena aí está, pronta a continuar. Esse tempo de adversidade reforçou as vossas motivações?

MC - Foi um período muito duro, mas que ao mesmo tempo serviu para uma reflexão sobre o que realmente desejávamos fazer no futuro. A escassez de recursos e a incerteza levou a que fossemos bastante mais assertivos e muito mais metódicos na conceção e implementação das nossas atividades.

Quase paradoxalmente, no meio de tempos tão atípicos, surgiram várias linhas de apoio às artes a que nos candidatamos impulsivamente, entre o final de 2020 e 2021. O facto de termos recebido novos apoios governamentais, para além do Município de Loulé, fez com que déssemos um salto considerável na nossa gestão interna, não apenas por conseguirmos melhores condições para trabalhar, claro, que está na base da “luta” constante deste sector, mas porque nos permitiu concretizar atividades e espetáculos com outra qualidade, mais próxima daquela que queremos que seja o normal da Mákina no futuro.

 

V.A. - Com que apoios contam?

MC - A nível financeiro, contamos neste momento com o apoio do Programa Garantir Cultura (Républica Portuguesa – Ministério da Cultura), da Câmara Municipal de Loulé, e tivemos o apoio da DGARTES na criação “Tive 1 ideia para 1 dueto”, (que também foi financiada pela Bolsa de Apoio ao Teatro do Município), e da Direção Regional de Cultura, que contribuiu para alguns concertos da iniciativa MdC Morning Jazz.

Temos ainda o apoio da Loulecópia, e outros apoios e parceiros pontuais, específicos da atividade a ser desenvolvida, como a Gráfica Comercial, a ETIC Algarve ou Associação Cultural e Recreativa de Músicos de Faro, por exemplo.

 

V.A. - No que respeita a espaços e outras infraestruturas para a prática da cultura na cidade, no concelho e mesmo no Algarve, que se vos oferece dizer?

MC - Loulé tem uma dinâmica cultural incrível, reconhecida a nível nacional, mas sofre com a falta de espaços de apresentação de média / grande dimensão. Esta lacuna é reconhecida por todas as entidades culturais louletanas, e é realmente difícil encontrar alternativas, porque não há espaços equipados que possam servir esse propósito. Este facto condiciona bastante o desenvolvimento do trabalho das estruturas locais, que acabam por não conseguir apresentar os seus projetos mais do que uma vez na sua própria cidade. Alternativas surgirão, estamos certos, até porque, apesar de tudo, a Câmara tem sido incansável e apoia de sobremaneira os projetos artísticos do concelho.

Quanto à região Algarvia, acreditamos que estamos a viver um momento de efervescência especial, com cada vez mais estruturas profissionais cujo trabalho começa a ganhar visibilidade para além da esfera local. A candidatura a Capital da Cultura “Faro 2027” também pôs um certo tom no ar, que interessaria não perder independentemente do resultado… a de que somos “dignos de” e temos muita arte para oferecer.

 

V.A. - Projetos? Objetivos para o futuro?

MC - Muitos! Pequenos e grandes, e ambiciosos.

Tivemos recentemente o Festival Contrapeso, em dezembro de 2021, que era um desejo muito antigo e uma das nossas maiores apostas do ano passado, e que foi possível, nestes moldes, graças ao Programa Garantir Cultura.

Acreditamos que se o acesso e fruição de projetos de alta qualidade não for um exclusivo de capitais e elites, conseguiremos humanizar e estimular a produção artística, tão necessária para a nossa existência em sociedade, assim como o espírito crítico que necessariamente 'exige' um rigor e qualidade cada vez maiores por parte dos criadores.