Por: Padre Carlos Aquino | effata_37@hotmail.com

“Convertei-vos e acreditai no Evangelho” (Mc 1, 15).  Para todos os que acreditam, a Palavra de Deus dirige-se sempre ao homem situado na realidade concreta do seu viver e agir. É nas circunstâncias atuais da sociedade a que pertencemos e do mundo, que assiste agora, surpreso, a uma guerra motivada por interesses geopolíticos e económicos injustos, sinuosos e mesquinhos, que devemos aceitar este convite, como condição indispensável para uma vida nova, de fraternidade universal e de paz, para um renascer das cinzas, símbolo da nossa fragilidade e caducidade.

Essa vida nova, jamais a alcançaremos se nos faltar a coragem de uma profunda e inadiável mudança, da tomada de consciência dos próprios limites e faltas, da reforma de mentalidade e do olhar, da revisão da vida à luz dos valores humanos e da fé, à renúncia do poder opressivo do pecado.

Aprendemo-lo de modo significativo neste tempo da Quaresma, um profundo tempo de deserto.

É diante dos desertos da nossa existência, nesses espaços de silêncio e de solidão, de provação, que podem ser também lugares da experiência do absoluto; verdadeiramente livres, confrontados com as últimas questões sobre a nossa existência, longe do barulho e da superficialidade; no despojamento humilde e verdadeiro de nós mesmos, abertos ao dom da vida, que vence a morte; provados mas vencedores nos sofrimentos, com a firmeza da fé, da escuta e do amor, que desejamos viver este tempo, no despojamento do que julgamos possuir ou pretendemos dominar; no despojamento do ilusório poder que nos seduz; no despojamento da imagem que os outros têm de nós e que nós temos de nós próprios para nos libertamos do mal com a verdade.

Todo o poder que não é serviço humilde, corrompe, paralisa, reduz. Em Deus o poder é compaixão, misericórdia, missão. Em Jesus amou-nos até ao fim.

A todos. O Seu poder é entrega, gratuidade, partilha, perdão, ternura. Não podem ser para nós frágeis e vazias atitudes. Neste Tempo, aceitemos ser iluminados por uma Palavra que traz luz, dando a prioridade ao amor e à paz.

Façamos nossa esta bela oração: “Senhor, que és o céu e a terra, e que és a vida e a morte! (…) /Dá-me alma para te servir e alma para te amar. Dá-me vista para te ver sempre no céu e na terra, ouvidos para te ouvir no vento e no mar, e mãos para trabalhar em teu nome. / Torna-me puro como a água e alto como o céu. Que não haja lama nas estradas dos meus pensamentos nem folhas mortas nas lagoas dos meus propósitos.

Faz com que eu saiba amar os outros como irmãos e servir-te como a um pai. /[...]/ Minha vida seja digna da tua presença. Meu corpo seja digno da terra, tua cama. Minha alma possa aparecer diante de ti como um filho que volta ao lar. /Torna-me grande como o Sol, para que eu te possa adorar em mim; e torna-me puro como a lua, para que eu te possa rezar em mim; e torna-me claro como o dia para que eu te possa ver sempre em mim e rezar-te e adorar-te. /Senhor, protege-me e ampara-me. Dá-me que eu me sinta teu. Senhor, livra-me de mim.” (Fernando Pessoa)