As novas medidas do Mais Habitação colocaram a atividade de Alojamento Local (AL) a dois ritmos ao longo de 2023. A primeira metade do ano foi marcada pela corrida às licenças de AL em Portugal, de forma a antecipar a suspensão de novos registos proposta. Mas na reta final do ano assistiu-se a um recorde de cancelamentos de AL, para evitar pagar a nova contribuição extraordinária sobre o alojamento local (CEAL) já em 2024. Ainda assim, contas feitas, os números de novos registos de AL superaram - e muito - as desistências em 2023: por cada AL cancelado, foram registados mais de dois.
O pacote Mais Habitação foi apresentado no dia 16 de fevereiro de 2023 e revelou uma série de medidas que restringem a atividade de Alojamento Local, com o argumento de aumentar a oferta de casas no mercado. Uma delas diz respeito à suspensão de novos registos de AL nos territórios de alta densidade até 2030 – apesar de os municípios continuarem com poder de “levantar as suspensões de AL” nas freguesias onde considerarem que não existe carência de habitação, tal como explicou ao idealista/news Marina Gonçalves, ministra da Habitação.
A verdade é que esta medida impulsionou a corrida às novas licenças de AL, de forma a antecipar o travão do Executivo aos novos registos nestes distritos do litoral. Em concreto, houve 16.772 pedidos de novas licenças em 2023, mais 40% em comparação com o período homólogo, apontam os dados do Ministério da Economia e do Mar citados pelo Público. E este aumento de novos registos de AL foi mais expressivo, sobretudo, nos primeiros seis meses do ano passado. Além disso, foram os distritos com mais AL onde mais subiram os registos (Faro, Lisboa e Porto).
“A perspetiva de não ter a oportunidade [de registar AL] nos próximos 5 ou 10 anos, levou as pessoas a fazer registos, por precaução. Mas muitos destes podem não vir a operar no mercado”, disse Eduardo Miranda, presidente da Associação do Alojamento Local em Portugal (ALEP), à TVI.
Cancelamentos de AL atinge recorde em 2023 para não pagar novo imposto
Mas se o início do ano foi marcado pela corrida às novas licenças de AL, na reta final do ano somaram-se os cancelamentos de novos registos, de forma a evitar pagar em 2024 o novo imposto sobre o setor: a contribuição extraordinária sobre o Alojamento Local (CEAL), que foi aprovada a 7 de outubro em conjunto com o pacote Mais Habitação. Em concreto, o número de cancelamentos dos registos de AL atingiu as 7.234 unidades, um valor recorde já que representa quase o dobro do número observado nos anos anteriores, revelam os mesmos dados do Ministério da Economia. A maior parte dos cancelamentos de AL ocorreu nos distritos onde há mais alojamentos deste tipo, como Faro, Lisboa, Porto e Setúbal.
De notar que a maioria dos cancelamentos destes alojamentos temporários ocorreu entre outubro e novembro de forma a evitar pagar o CEAL, o novo imposto para os AL integrados em frações autónomas e registados até dezembro de 2023, que se traduz numa taxa de 15% sobre a base tributável. Esta taxa deverá começar a ser paga em junho deste ano, mas o Fisco ainda não explicou como vai ser calculada. Para a ALEP, este novo imposto é “inconstitucional”, motivo pelo qual o vai contestar em tribunal.
“Já prevíamos que as medidas do Mais Habitação fossem criar um ambiente de grande incerteza, mas não esperávamos que fosse tão caótico”, referiu Eduardo Miranda, explicando que “o aumento dos cancelamentos deve-se às novas medidas" deste pacote, com novembro e dezembro a registar três mil cancelamentos de AL, cita o Dinheiro Vivo.
Ainda assim, verifica-se que apesar das novas medidas do Mais Habitação o números de novos registos de AL supera – e muito- os cancelamentos. Contas feitas: por cada licença cancelada, foram registadas mais de duas novas autorizações ao longo de 2023.
Número de AL suspensos pode subir por não comprovar atividade
O que também é preciso ter em conta é que o número de cancelamentos de AL pode vir a subir mais nos próximos meses, uma vez que mais de 40 mil proprietários ainda não comprovaram a atividade até 13 de dezembro, o prazo estabelecido por lei. Isto porque, quem não provou a atividade de exploração do AL, terá as licenças canceladas pelas respetivas autarquias.
Até essa data, só 75 mil proprietários de AL comprovaram atividade (cerca de 60% do total). E não se sabe ao certo porque é que os outros 40% não comprovaram a atividade: se por esquecimento, questões técnicas, por estarem fora do país ou até por estarem isentos de fazer prova. Por isso mesmo, o responsável pela ALEP diz que o atual “número de cancelamentos não é alto, é uma gota de água”, frisando que se esperava um número de cancelamentos mais significativo, acima dos 30 mil.
Por seu turno, os municípios estão agora a analisar as propriedades que não comprovaram a atividade de modo a dar seguimento ao cancelamento dos AL. Mas a ALEP está em diálogo com as autarquias, apelando ao bom senso e flexibilidade de análise, para dar oportunidade aos titulares dos registos explicarem os motivos pelos quais não enviaram as provas. Mas corre-se o risco de este processo se arrastar “indefinidamente”, diz Eduardo Miranda, uma vez que não existe um prazo para que as autarquias concluam esta análise.
Este cenário está a colocar 109 municípios de pequena dimensão em risco de perder mais de 50% do AL. “São pequenas aldeias e vilas, na maioria em zonas rurais. Em muitos destes locais, que têm 30 ou até 15 AL, esta é a única forma de alojamento turístico disponível e correm agora o risco de ficar sem nada. Algumas zonas até com interesse turístico, como é o caso de Alcobaça [em 971 registos, 427 não fizeram prova]”, indicou o presidente da ALEP, referindo que Valpaços, Barrancos, Miranda do Douro e Sátão também registaram uma taxa de falta de entrega superior a 80%, cita ainda o Dinheiro Vivo.
Por: Idealista