por Diogo Duarte | Jurista, Licenciado em Direito e Mestrando em Direito Internacional | diogoduarte@campus.ul.pt

O Presidente filipino Rodrigo Duterte, eleito em 30 de Junho de 2016, prometera ainda durante a sua campanha eleitoral, uma implacável guerra às drogas e aos narcotraficantes. Semanas após ser eleito, Duterte, cumprira o que havia prometido, e lançou-se numa declarada campanha contra o narcotráfico. Em pouco mais de três meses, mais de três mil pessoas foram executadas pelas polícias filipinas ou pelos “esquadrões de morte” que Duterte abertamente apoia. Sem direito a um julgamento prévio, centenas de pessoas continuam a ser detidas e encarceradas, ou até mesmo, executadas.

O Presidente filipino parece não olhar a meios para atingir os seus fins. Declarando-se em total desapego com os direitos humanos, Duterte dirigiu-se, recentemente, aos ativistas e defensores dos direitos e liberdades humanas, numa atitude provocatória e vexatória, alegando não reconhecer os direitos dos traficantes e consumidores. O clima de medo vivido pela população filipina é de tal modo intenso, que mais de 700 mil pessoas (consumidores e traficantes) entregaram-se às autoridades policiais, temendo pela sua vida. O perigoso Duterte parece não recuar na política de combate às drogas. “Entregam-se ou morrem”, este é o lema do Presidente filipino que recentemente veio a defender a legitimidade da polícia para executar os indivíduos sobre os quais recaia a suspeita de serem toxicodependentes ou narcotraficantes.

O crescente consumo de drogas e o narcotráfico não são preocupações que atingem unicamente as Filipinas. Na década de 90, Portugal era um dos países europeus onde se registava o maior consumo de heroína. Estimava-se que 1 em cada 100 portugueses tinha problemas de dependência, quando na maioria dos países europeus a estimativa era 0,4 por cada 100 cidadãos.

Em face dessa realidade, impôs-se a necessidade de implementar uma estratégia que revertesse este cenário. Sobre a presidência de Jorge Sampaio, foi aprovada a atual estratégia de combate à droga, a qual assentava em torno de dois eixos principais: na descriminalização de todos os tipos de drogas e no tratamento e recuperação dos toxicodependentes. Ainda em 1999, dois antes desta estratégia ser implementada, a ONU contestava a política portuguesa de combate às drogas, apelidando-a de radical, face aos argumentos do potencial aumento do consumo e do aumento dos comportamentos de risco associados.

Quinze anos depois, é a própria ONU, através da Comissão de Estupefacientes e Órgão Internacional de Controlo de Estupefacientes, que congratula Portugal pelos resultados positivos que alcançou. Em cerca de década e meia, o número de mortes por overdose desceu abruptamente; o consumo de drogas entre os adolescentes (14 – 19 anos) baixou significativamente; o consumo de drogas pesadas decaiu para mais de metade; e o número de doenças infectocontagiosas transmitidas pelo uso de seringas e outros utensílios foi drasticamente reduzido.

O tratamento clínico dos toxicodependentes foi outra das bandeiras desta estratégia. Ao tornar o consumo de drogas numa questão de saúde pública e não de criminalidade, alcançaram-se, simultaneamente, dois objetivos. Por um lado, a recuperação e a regeneração do indivíduo apresentam índices de maior sucesso face à marginalização e repreensão penal. Por outro, a descriminalização das drogas, permitiu ao Estado recentrar a sua estratégia de combate ao narcotráfico, sobretudo das drogas pesadas como a heroína e a cocaína.

Apesar da erradicação do consumo e do narcotráfico aparentar ser uma realidade idílica, a verdade é que hoje a conceção de que os fins valem os meios não logra acolhimento. Portugal, à semelhança de todos os restantes países, tem ainda hoje problemas relativos ao consumo e ao narcotráfico. É certo que a realidade de hoje é bastante mais positiva que a realidade vivenciada há 15 anos atrás. No entanto é importante compreender que o sucesso português alcançou-se em respeito pelos indivíduos e não contra eles.

A campanha de Duterte, manchada pelo sangue e pelo medo, é um erróneo exemplo das políticas extremistas implementadas a nível estadual, havendo motivos até, para se falar em terrorismo de Estado. A preocupação é percetível perante a Comunidade Internacional, no seio da qual se exige uma resposta e eficaz e efetiva do Conselho de Segurança da ONU. Todavia, se há motivos para acreditar que a diplomacia funciona – e a diplomacia portuguesa tem disso exemplos – permitimo-nos a sugerir que Portugal seja também o embaixador das políticas de combate ao crime, e que amistosamente aconselhe Duterte acerca de uma estratégia, sobre a qual, os seus resultados são largamente reconhecidos e elogiados.